LEMBRANÇAS DE NATAIS PASSADOS


Algo que os idosos têm de muito bom são as lembranças sobre os mais diversos assuntos; guardam carinhosamente em um cantinho de suas mentes e corações. Quase sempre, relatam para seus amigos e parentes algumas dessas recordações adaptando-as à compreensão de quem as ouve não importando a idade que esse público tenha.

Sempre gostei de passar as festas de Natal e de ano novo junto da minha família. Eram eventos que solicitavam a presença dos parentes mais próximos, que falavam sobre fraternidade, união, gratidão, esperança e fé.

Peru assado, peixe recheado ou um belo prato de bacalhau, castanhas, nozes, tâmaras, bolos natalinos, pães, sequilhos, frutas da estação, a mistura deliciosa dos agridoces, fossem nos molhos para umedecer a carne, na gelatina com legumes que todos apreciavam e pediam para termos à mesa e mesmo a sangria, bebida feita com vinho, água, açúcar e pedaços de frutas, preparada para servir às crianças, mas que todos tomavam de tão gostosa que ficava.

Houve um tempo em que, influenciada pela tradição e pela figura de Papai Noel, a proximidade dessas datas despertava em mim o desejo de garantir presentes para cada pessoa com quem iria encontrar nessas festas.

Saía por aí, sem rumo certo, à procura dos presentes mais adequados para distribuir à meia-noite entre todos os parentes. O problema era que, por ter que trabalhar o dia inteiro, não raro ocorria de comprar os presentes, assim como alguns dos ingredientes para a ceia, na última hora, o que me deixava exausta pela correria e confusão que enfrentava nas lojas e mercados.

Meus pais e irmãos durante muitos anos me pediam, justamente no momento em que nos arrumávamos para receber a família, para eu embrulhar os presentes que também eles haviam comprado. Assim, antes mesmo do horário da festa, eu ficava sabendo o que cada um iria ganhar.

Para cada presente fazíamos etiquetas personalizadas com os votos de Feliz Natal. Era uma grande surpresa o que todos iriam ganhar, menos para mim, pois os meus presentes, eu os recebia juntamente com os outros.   Bons tempos aqueles, que deixaram saudade da alegria que sentíamos em compartilhar com a família momentos que me pareciam mágicos.

A família cresceu e aos poucos, os subgrupos que dela se formaram passaram a organizar as festas de final de ano com seus parentes mais próximos. Assim, com menos participantes, mas com a mesma alegria, continuamos a comemorar essas duas datas tão importantes para todos nós.

Então, aconteceu algo totalmente inesperado: mamãe tornou-se cardiopata e, após o implante do marca-passo sua saúde que estava bem debilitada melhorou, porém não completamente. Infelizmente ela já não podia mais andar pela casa, subir e descer a escada, tendo que se restringir na maior parte do tempo, a permanecer em seu quarto.

Nem por isso deixamos de comemorar o Natal e a passagem de ano. Queríamos que mamãe participasse conosco de ambas as festas e fizemos pequenas e singelas adaptações: arrumávamos a mesa natalina na sala de jantar, mas subíamos para fazer em seu quarto a ceia, a troca de presentes, a reunião familiar.

Servíamos um lanche mais leve próximo das vinte horas e, a partir desse horário, ficávamos no quarto conversando com ela. À meia-noite, todos usando roupas adequadas à ocasião, fazíamos um brinde com as melhores canecas da casa. Ao invés do champanhe, café com leite – algo que mamãe sempre apreciava beber.

Foi assim que aprendi que a presença das pessoas queridas é muito mais importante do que os presentes materiais – não que essa condição me fosse desconhecida, embora nunca houvesse passado por ela. Aprendi que com um pouco de criatividade e carinho podemos transformar o final da história em algo encantado.

Digo isso porque naqueles anos em que mamãe já se encontrava enfraquecida, bebi os melhores cafés com leite de minha vida. As canecas reluziam mais do que as taças de cristal e os brindes que fazíamos eram sempre em homenagem à vida, gratidão e fé.

 O que mais alguém poderia querer? 

2 comentários:

  1. José Clemente Méo Junior19 de dezembro de 2019 às 09:11

    Malú, que linda história!!!

    Quantas recordações, não é mesmo?! Você contou de uma tal forma que pude visualizar todas as cenas em minha mente e, confesso, isto me emocionou e fez meus olhos ficarem marejados pela tua história e pelas minhas memórias que foram despertadas!!!

    Ufa!!! Quanta emoção.

    Que consigamos passar o verdadeiro espírito do Natal para os nossos familiares, amigos, conhecidos e para cada um que
    encontramos em nossa jornada e que isto seja em todos os dias e não somente nesta época natalina.

    Feliz Natal e um Ano Novo cheio de paz, felicidades, saúde e realizações!!!

    José Clemente Méo Jr.

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    1. José Clemente Méo Junior, que alegria saber que aquilo que escrevo pode sensibilizar pessoas. Tenho saudade de tudo o que contei. São fatos que ficaram marcados em minha mente e em minha alma. Percebo também que, às vezes, são pequenos detalhes que, com sua simplicidade fazem a diferença e nos sensibilizam a ponto de ver beleza e magia em momentos que poderiam ser tão sofridos. Grata por sua presença tão amiga no caminho que venho percorrendo. Que consigamos transformar todos os nossos dias em dias de Natal neste e nos muitos anos que ainda temos pela frente. Um beijo, meu amigo.

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