Vamos supor que você faça parte de um grupo de idosos que hoje
participa de uma primeira reunião para discutir seus problemas. São vinte pessoas, não se conhecem,
vindas dos mais diferentes pontos da cidade. Qual a tarefa? Cada um, à sua vez,
deve levantar-se, dizer o seu nome e nomear uma de suas muitas características
mais marcantes, utilizando um único adjetivo. Qual seria a característica que
neste momento você citaria?
Em um grupo de idosos com os quais eu trabalhava uma participante
comentou:
Até um tempo
atrás eu diria sem relutar: timidez. Hoje, ficaria em dúvida porque distingo
que há outra característica que talvez suplante minha timidez e com ela se
confunda: a ansiedade.
Minha carreira
profissional foi marcada por muitos momentos de liderança. Como professora,
lecionei por quinze anos. Como coordenadora pedagógica, cheguei a conduzir
diversos grupos de professores e, tanto nas aulas que ministrava como nas
reuniões que dirigia, não raro acontecia de parar uma frase no meio, olhar para
as pessoas e dizer: ... deu branco!
A primeira observação que eu fiz foi que “dar branco” não é
necessariamente um problema dos idosos. Ela continuou:
Acredito que qualquer
um que estivesse em meu lugar sentiria o mesmo desconforto que eu claramente
manifestava. Dizer que esses lapsos aconteciam por causa da timidez ou,
principalmente, da memória, não me convencia totalmente – embora eu usasse essa
desculpa para me justificar.
Achei muito interessante esse comentário e, a partir dele, comecei a
buscar informações que pudessem garantir ao grupo maior compreensão sobre o que
ela me confessara:
Hoje sei que a
ansiedade me acompanha há algum tempo e, por muitas vezes, foi ela que dominou
a situação. Recordar-me ou não do que pretendo dizer não significa,
necessariamente, problema de memória; muitas vezes é consequência da ansiedade.
A ansiedade é sentimento comum para os seres humanos, independentemente
de sua idade. Ela age como um alerta para a possibilidade de vivermos situações
indesejáveis ou perigosas. Antecipando a situação, podemos nos preparar
devidamente para enfrentá-la. Essa é a condição normal da ansiedade.
Quando exacerbada, a partir dessa sensação de iminente perigo, ficamos
alterados, criamos defesas, obstáculos, “travamos”, ficamos tão aflitos e
nervosos que mal sabemos explicar o que está ocorrendo. Até as palavras faltam!
Sofremos desmedidamente por algo que poderá não se concretizar. E, o que seria
um mecanismo de defesa, então, se transforma em carrasco e a pessoa fica
atrelada a esse sentimento que a paralisa e tira sua autonomia, suas forças e
energia. Neste caso, é sim um transtorno a ser cuidado por profissionais da
saúde.
Entretanto, no caso desta participante do grupo, parecia que se tratava
– como na maior parte das vezes – de levar o esquecimento com bom humor, pedir
ajuda às pessoas sabendo que, a qualquer momento, nosso cérebro “dará um jeito”
de nos fazer lembrar. Isso reduzirá a ansiedade.
Depois, antes de pensar ser uma “doença do idoso” cuide de rever seus
hábitos, como por exemplo: se organizar melhor, avaliar prioridades, pedir ajuda
para diminuir a carga de trabalho e preocupações. Criar rotinas para
ter um tempo de relaxar, distrair-se, cuidar de si mesmo. Como último conselho:
não se preocupar tanto com isso.
Tá muito bom. Às vezes me esqueço do nome de um autor cujo livro ja está quase roto de tanto ser consultado. Seu artigo me ajudou a dar a (pouca) importância que o problema merece. Obrigado
ResponderExcluirTá muito bom. Às vezes me esqueço do nome de um autor cujo livro ja está quase roto de tanto ser consultado. Seu artigo me ajudou a dar a (pouca) importância que o problema merece. Obrigado
ResponderExcluirDonadio, M grata por seu comentário e participação. Um dos objetivos deste blog é promover um diálogo a respeito das várias informações que abordamos e que têm a ver com a qualidade de vida dos idosos. Sabemos que, uma coisa que nos perturba e muito, são as questões ligadas à memória. Lapsos são comuns na vida de qualquer pessoa. Mas, antes de pensarmos tratar-se de um problema maior, precisamos averiguar o que estamos fazendo com o tempo que dispomos, quais os compromissos que nos impomos - ou deixamos que nos imponham -, quais cobranças e expectativas nos admitimos ter, que tipo de frustração vivemos no presente, enfim, precisamos entender o momento que vivemos antes de nos considerarmos em estado de risco para doenças que afetam a memória. E localizando, com serenidade, o que nos provoca estresse, medo, ansiedade, tristeza, nos propormos a mudar nossos hábitos e rotina. Só depois disso, se continuarmos verificando que esses lapsos de memória não decrescem é que devemos pensar em procurar profissionais da saúde, competentes para estabelecer um diagnóstico. Um grande abraço.
ExcluirAceitar os limites, ter um profundo autoconhecimento ajuda muito! Ótimo artigo! Sem culpas quando "dá branco"
ResponderExcluirtatinha, seja muito bem vinda! Grata por seu comentário. Muitas vezes não nos damos conta de que nós somos as pessoas que menos nos conhecemos. Aceitamos tantas pressões, tantas atribulações, informações tão variadas e controversas, competências que mais nos desgastam do que nos auxiliam a crescer, sem olharmos para nós mesmos que não percebemos o quanto toda essa carga nos faz mal. E, como tudo nesta vida, onde não há equilíbrio, há sofrimento e desgaste. E, quanto mais cedo fizermos essa avaliação sobre como estamos agindo conosco, melhor, pois ainda somos capazes de mudar o rumo de nossas histórias. Um grande abraço.
ResponderExcluirTrabalhar em si, seus medos.
ResponderExcluirA leitura de seus artigos, é sempre uma nova possibilidade de rever conceitos.
Mayre Vigna,trabalhar nossos medos, pois eles nos confundem e nos levam a caminhos mais desgastantes. Exige determinação, a clareza de que somos maiores que eles e a certeza de que, sem eles seremos melhores e mais felizes. Bjs
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